sábado, 12 de novembro de 2016

Donald Trump já teve interesse em Campinas

O hotel do grupo Trump na Barra da Tijuca: empreendimento acabou entrando na mira da Procuradoria da República, que investiga irregularidades
Divulgação
O hotel do grupo Trump na Barra da Tijuca: empreendimento acabou entrando na mira da Procuradoria da República, que investiga irregularidades
O bilionário norte-americano Donald Trump, eleito nesta semana presidente dos Estados Unidos, já se interessou em fazer negócios em Campinas. Mas o projeto, na área imobiliária, acabou sendo implementado sem que ele participasse efetivamente do investimento.
Em 2011, Trump sentou-se com o empresário campineiro Mario Garnero, em sua sala na Trump Tower, em Nova York, para discutir o assunto. Eles falaram do que hoje é o Entreverdes, empreendimento imobiliário que reuniria, segundo cálculos feitos na época, investimento de algo em torno de R$ 600 milhões.
“Ele é muito pouco burocrático e muito direto”, disse Garnero ao avaliar o encontro. A revelação foi feita pela jornalista Sonia Racy, em sua coluna “Direto da Fonte”, publicada na edição desta sexta-feira do jornal O Estado de S. Paulo.
Ivanka Trump, filha do presidente eleito dos EUA, e um de seus principais interlocutores de negócios, veio ao Brasil e passou uma semana hospedada na casa de Garnero para discutir o assunto.
O projeto, de alto padrão, contempla terrenos com mais de mil metros quadrados, fica no distrito de Sousas e foi um dos propulsores da obra de extensão da Avenida Mackenzie, entregue para tráfego no começo deste ano e que criou um novo acesso a Sousas. Sem Trump, a obra foi viabilizada em parceria com a construtora Rossi. E vai muito bem.
Outro filho de Trump, Donald Jr., que atua com ele em suas empresas, também andou flertando com o Brasil, mas sem transformar o projeto em realidade - pelo menos até agora. Em 2012, ele negociou com o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB), um projeto de mais de US$ 2 bilhões que previa revitalização de parte da zona portuária da cidade.
A proposta está engavetada, mas o grupo construiu um hotel na Barra da Tijuca, que foi aberto para receber hóspedes para as Olimpíadas, em agosto, mesmo sem estar 100% pronto. Trump pai havia prometido a inauguração a tempo de receber gente para os Jogos - e fez valer sua palavra.
O Trump Hotel Rio de Janeiro abriu as portas com 70 dos 170 quartos em funcionamento e um canteiro de obras dentro do empreendimento. Na recepção, a informação dos funcionários era que o negócio estaria operando em “soft opening” - uma espécie de abertura adiantada. A prática é comum em restaurantes: o cliente paga um preço menor pelos pratos, prometendo, em troca, fazer vista grossa para eventuais desajustes.
No último dia das Olimpíadas, com a cidade lotada de turistas, quem fosse à Rua Professor Coutinho Fróis, na Barra, encontrava um quarto no Trump Rio por R$ 600,00 - cerca de 20% do valor cobrado na acomodação mais “popular” do Copacabana Palace, por exemplo.
Na última sexta-feira, era possível reservar um quarto para uma pessoa no hotel por R$ 509,00 pelo site booking.com. A nota média dos hóspedes que passaram por lá, de 7,7 , não está entre as mais altas do sistema.
Investigação
Mas nem tudo são flores para Trump no Brasil. A Procuradoria da República no Distrito Federal abriu um PIC (Procedimento Investigatório Criminal) e um inquérito civil para apurar possíveis irregularidades em negócios do grupo The Trump Organization, que pertence ao magnata.
A suspeita foi levantada pelo jornal “Folha de S.Paulo” em outubro, e indicava que fundos de investimentos favoreceram “de forma suspeita” a construção do hotel na Barra, feita em parceria com fundos de pensão. O caso tramita como desdobramento da Operação Greenfield, que investiga irregularidades em projetos bancados por fundos de investimento de servidores estatais.
O alvo das investigações é o FIP (Fundo de Investimento em Participações) LSH Barra, constituído em abril de 2012 e que recebeu investimentos dos fundos de pensão Serpros (Instituto Serpro de Seguridade Social), vinculado ao Ministério da Fazenda, e do Igreprev (Instituto de Gestão Previdenciária do Estado do Tocantins).
O FIP teve por objetivo realizar investimentos na LSH Barra Empreendimentos Imobiliário, sediada no Rio. O Serpros e o Igeprev investiram, juntos, cerca de R$ 130 milhões no projeto.
O LSH Barra, segundo o Ministério Público Federal, foi criada para viabilizar um hotel cuja construção “deveria ter começado em janeiro de 2014, em conjunto com o grupo The Trump Organization, controlado pelo empreendedor Donald John Trump, com atuação no Brasil capitaneada pelo vice-presidente executivo de Construções e Aquisições da holding, Donald Trump Jr.”.
O hotel, porém, não ficou pronto antes das Olimpíadas do Rio. Sua inauguração em 2016, de forma parcial, “impediu a realização de receitas tal como previsto em 2014”, segundo a Procuradoria, que quer saber se houve “temeridade” no investimento, pois os dois fundos de pensão “são pequenos, que contam com recursos garantidores modestos, se comparados com fundos de pensão como Funcef, Petros e Previ”.
O principal ponto da apuração é saber se houve uma “sobreprecificação” nos valores destinados ao hotel pelos fundos de pensão Serpros e Igeprev - ou seja, se os gestores já sabiam que o hotel não renderia o retorno anunciado na constituição do negócio, em 2012, e mesmo assim negociaram as cotas com os fundos de pensão tendo em conta projeções supervalorizadas.
“Em razão dos elementos financeiros e econômicos mencionados, é possível que Serpros e Igeprev tenham que realizar a provisão de mais da metade de seus investimentos no FIP LSH. É necessário, porém, investigar se a empresa objeto do investimento já estava sobreprecificada desde o aporte inicial de capital no fundo, o que poderia significar uma gestão fraudulenta das instituições investidores por parte de seus diretores/gestores, com a participação do agentes econômicos e avaliadores envolvidos”, afirma a Procuradoria.
O órgão também quer saber se algum crime foi cometidos para o fechamento do negócio. “É necessário ainda verificar se o favorecimento pelas entidades de previdência da empresa LSH Barra Empreendimentos Imobiliários e do grupo empresarial The Trump Organization deu-se por meio de pagamento ilícito de comissões e propinas, tais como noutros casos apurados no bojo da Operação Greenfield - considerando, em especial, a grande similitude do modus operandi”.
A segunda linha de apuração tem por objetivo apurar as parcerias do grupo The Trump Organization em torno de empreendimento de escritórios na região de Porto Maravilha, na zona portuária do Rio. Segundo o procurador da República, o The Trump Organization foi beneficiado “de forma suspeita” por um FI (fundo de investimento) do FGTS, administrado pela Caixa Econômica.
A Procuradoria da República afirma que no bojo de ação penal já em andamento na 10ª Vara Federal de Brasília, há “demonstração de que, com a complacência da vice-presidência de Gestão de Ativos de Terceiros da Caixa Econômica Federal, recursos do FI-FGTS foram aplicados indevidamente, em troca de propinas que, entre outros, beneficiaram ilicitamente o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Entre os casos apurados em que se registrou a cobrança de propinas, está o investimento no projeto Porto Maravilha”.

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